quinta-feira, 31 de março de 2016

Forca

Fui condenado à morte lenta.
Motivo: amor;
abandono;
inconsequência.

Meses um e dois, exatos,
definhando,
carne comida por ratos
nas masmorras feita dos crânios
daqueles que se entregaram.

Mas por fora, o sorriso,
a piada, risada forçada
que perdurou por dias;
até o último pedido de socorro
no sarau;

a escuridão me consumiu
e eu aceitei minha pena.

Enquanto subia os degraus
para o grande palco principal,
ouvia vozes, de longe:
"fica bem"
                "vai passar"
"melhoras"

Eu, algemado na dor,
mal pensava.
Observei todos me observando
enquanto a corda descia ao meu pescoço.

O chão se abriu,
não agonizei.
Perdi os três que eu mais amava,
a morte me seria um privilégio dado.

E até hoje continuo pendurado.



E assim me despeço do Poesia de Mau Gosto. Foram mais de dois anos de minha participação no Blog, várias fases da minha vida estão em posts daqui. Então, obrigado a quem leu os meus poemas, até mais.

terça-feira, 29 de março de 2016

Moça

Seis bilhões de galáxias;
uma presa num temporal
(em tempo real),
mas não por escolha.
Câmbio universal:
dor.

Já a vi de azul, roxo, rosa,
outras cores,
aprendeu a usar suas lágrimas
para regar as flores
de dentro de si.

Entre cristas e vales
existe ela;
que salvou-me
de rasgar minhas próprias veias
com um sétimo corte:
o fio da vida.

Só temem a água
aqueles que já se afogaram.

(Dedicado à pessoa que tem me ajudado desde o início do meu tratamento).

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Nemesis

Inspira,
deixa a dor sair
com o ar que expiras.

Por mais que (tu) espires,
não sentes,
não ri.

Podes beijar quantas bocas quiser,
comer com talheres ou colher,
ir de ônibus ou a pé,
mas isso não sai de ti.

Te vês cara-a-cara com teu inimigo;
aquele que entristece teus poemas
e atormenta teu sono:

o maldito sentimento de abandono.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Presa

Camaleão do amor
Que posso receber,
Misturo-me ao teu
Resistente poder
De enganar.

E ainda que eu minta
Sobre a suficiência
Do que recebo de volta
Insisto em ficar
Mesmo que parasita.

A tua troca de pele
Repele os meus instintos.

Até que, predador,
Me dê o bote
Sem salva vidas
E fuja para o seu habitat.

Desencontramo-nos
Em tantos transmutar
Esconder, camuflar,
De tanto subverter
a ordem de saber estar.

Dois animais
Cumprindo seu papel
Na cadeia alimentar.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

Desfecho (Carnaval III de III)

Nem tenta
me ungir com água benta,
ou sugerir banho em ervas;
a vida (minha) que tanto prezas
já se afogou em pesadelo.

Toda noite imploro pra não vê-lo
em sonho;
(onde eu deveria estar seguro)
logo suponho:

este deve ser meu fim.

Mas que graça teria se a gente só morresse?
Não, temos que chorar desesperadamente
por horas,
por dias,
pelo janeiro inteiro,
até não restar nada,
só um corpo com a corda enrolada
no pescoço,
suspenso,
sem vida.

E é só o que me falta.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

Suicídio (Carnaval II de III)

Tu não temes a morte, quer conhece-la.
Choras toda noite,
mas te obriga a se calar.
Ninguém acredita em ti.

Ninguém acredita que teu maior desejo
é deixar de existir.

"Ah, isso passa".
Ouves enquanto tu
cais em desgraça.
E já não queres ver teus amigos,
já não queres te ver.
Aos poucos, perde o gosto
por tudo que, antes, te dava prazer;
(nem a poesia te salva).

E depois de dias percebe:
a tristeza engoliu teu ser.

Inferno (Carnaval I de III)

Acorda, mas não desperta.
Tua inimiga, esperta, ataca na tua chaga:
a falta dele.
E os dias se tornam infinitos,
vazios;
em um mar de navios
te sentes canoa,
te sentes a pior pessoa,
e já não sentes nada além de dor.

Morres na segunda,
na terça e na quarta.
É assustador como tristeza
aos poucos
te mata.

terça-feira, 26 de janeiro de 2016

Renúncia

Me apedrejam com elogios,
moço bonito, esforçado, charmoso,
que não deveria cair por pouco,
que pareço ser douto,
logo arranjarei outro.

Me cospem conselhos:
"Vai lá, o reconquista,
mostra teu apreço".

À todos, agradeço,
mas desistam.

Já não resta nada de mim.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

Automat E. H.

Automat, pintura de Edward Hopper
eu entendo.
os dias passam lentos,
as noites são tão frias!
a vida se refugia
debaixo das camas

eu entendo.
nós somos nossos monstros
assistimos nossa autodestruição
pela televisão
e achamos graça

eu entendo.
nós viajamos com o proibido
nos prendemos ao tributário
e não vemos toda a farsa

eu entendo.
eu também sou desse mundo
apesar de não querer
e nem parecer ao menos

eu entendo.
e também quero lugares pequenos
fora desses lares de egos inflados,
desse humor que diz que o mundo
é você e nada mais

eu entendo.
dói, mas eu entendo.
as pedras choram,
as plantas morrem.
e eu entendo.

uniVerso

sinto-me tal qual
um planeta.
gigante e pequenino,
um menino de
bilhões de anos.

carbono, nitrogênio
oxigênio, enxofre
sou gás e pedra.
vazio.
frio.
vil.

tudo é distância
e vulnerabilidade
sem força de gravidade
para me sorver

e quando for eu
desolação, morte
e casca sem coração,
que Marte vou
terra-fazer?

Réplica: Descontrole

Nota: Não foi eu quem escreveu este poema. Recebi de presente de uma amiga especial, e nossa, acho que era o que eu estava precisando.

"Um hora
Vai embora
Com as lembranças
Daquele que te deixou imerso
Em outra dimensão
Onde cada pedaço dele
Foi transformado em verso
Apavorando seu coração.
Mas abraço é um conforto
Mesmo que o tão esperado não lhe venha mais
Não és um peso morto
Mas um pedaço
Despedaçado
Em construção
Que a fé no tempo não esgote
Seja forte
Sempre há uma solução."

domingo, 17 de janeiro de 2016

Descontrole

Já cansei de mim,
dos meus versos.
Não me quero mais.
(olhem meu estado)
meu espírito, falho,
meu corpo, em retalhos,
e abraço nenhum me serve,
nenhum
além do dele.

O observo de longe,
lidando com recentes perdas,
num quarto cheio.
Devaneios,
o coração se apavora;
e vários dias se passaram
em somente uma hora.

Um março cruel se aproxima
e tudo tem que estar melhor.

Mas eu já perdi a fé no tempo.

terça-feira, 12 de janeiro de 2016

Momentâneo

nesse momento –
em que meu espírito
me abandona –
surge o tormento.

lá fora. aqui dentro.

maus pensamentos
vêm à tona,
lembrando que poeta
é como qualquer ser,
apesar de rabiscar versos
da alma irrequieta,
de tentar ver
além do possível.

enquanto vejo que vejo
e nada vejo,
enquanto evito o vazio
que me invade,
percebo-me cheio
de meio.
cheio de poesias
pela metade.

então assimilo
a verdade
que canta minha lira, senhora:

isso é tudo uma grande mentira.

então assimilo
a maldade
que esbarra em minha lira, senhora:
isso é só um momento de ira.

Doce

Põe debaixo da língua,
sente o amargo
e espera adormecer;

Adormeci.

E o chão já não era o mesmo,
e eu alcançava os céus
e via o vento;

o processo, que já era lento,
estagnou.

Me senti perseguido
por mim mesmo;
o peito chora,
o lábio ri,
e, ao longo da noite,
a sobriedade volta
infectada;
a calçada se mexe,
os postes se beijam.

E o corpo acaba dormente,
trêmulo no tapete,
devorado por listras invisíveis
e memórias.

domingo, 10 de janeiro de 2016

Cardápio

Segredo:
priva-te da visão,
já não o vês.
Cegueira poética,
enxergas o que não quer.

A dor no teu peito
só cessa com teu gozo,
minutos de liberdade,
egoísmo.
Gemidos de prazer
de segundos (ou terceiros)
te enganam.
Não escolhes a dedo,
não te importa com segredo.
Te entregas à carne,
maltratas teu credo,
teu sofrimento não cabe em metro.

Já esteves dentro de dois,
três, quatro,
nem sabes.
Corpos negros, brancos,
magros, fartos,
desejo, tesão,
tudos se mistura,
cuecas saltando
voluntariamente,
os lábios e os dentes
passando por cada curva,
como chuva depois de um dia quente.

Orgasmo,
alívio momentâneo,
canseira.
E no fim,
não muda nada:
tu volta a se sentir
como poeira.

Bagunça

vasos de cerâmica
quebrados
adereços icônicos
jogados
pães
queimados
tudo
revirado.

e a mente entende
que na sua casa
já não vive só
e que a angústia
é uma criança:
bagunça, dança,
balança-se e dorme.
não tanto quanto devia

saudades de quando
eu achava que me conhecia...

sábado, 9 de janeiro de 2016

Poema de Presente

Procurando, em mim, defeitos que justificassem
O não desenrolar do laço que foi apertado
Até virar nó na garganta e noite de choro.

Tolice, claro! Se laço não virou enfeite, que se dane!
Tenho a certeza de não ter nascido para ser bibelô de cozinha
E muito menos a obrigação de ser papel de presente bem bonito.

Também não estou pra ser conteúdo surpresa
E nem desencanto de criança ao rasgar casca
E descobrir engano de papai noel no Natal.

Sou produto artesanal exposto na avenida
Adesivado com etiqueta autoexplicativa!

Se quiser morrer de casa, que morra!
Eu quero ser diagnosticado com "rua"
E ser atropelado com minha arte
Bem no meio da lua.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

Nem Todo Mundo Merece Virar Poesia

Por enquanto
não há mais sorrisos
e no meu teto de vidro
surge mais uma rachadura.

Ô vida dura,
ensina aos sem ternura
que com poeta não se brinca,
a mania de por tudo em verso
me prejudica.
Poesia (ainda) não é moeda,
poucos sabem seu valor.
Eu, menino poeta,
transformo meus casos em poema,
e veja só,
de cinco
não tenho nenhum.

Criei medo,
escrever sobre amor parece
não levar a nada.
Será minha pobre alma
(amor)diçoada?

domingo, 3 de janeiro de 2016

Final

Foi difícil admitir que o laço
Desfeito, era só o fiapo
Amarrado na agulha.

E que o abraço de conforto
Não chegava mais.
Não havia paz no peito:
Trovejava no meu porto

Eu não me vi passar pela porta
Eram tantas as janelas.
Em que fresta escapamos?

Com luzes acesas e palavras intranquilas
Olhei firme o descompassar inquieto
Das ondas de três anos atracar no cais,
Apagar a areia, o sal, e o teu nome.

Hoje
Todo o tempo do mundo me abraça
E pergunta meio sem graça
"e agora?"

Que Este Poema Seja O Último.

Eu, crente de que sabia de algo,
me fiz de professor,
amigo,
namorado.
Coitado, eu.

Tenho medo de dormir
e sonhar,
pois não quero te ver.

os olhos teus
me desmontam.
Teu sorriso,
tuas curvas,
cada detalhe
do teu rosto,
do teu corpo,
não cabem em verso.

Então,
ignore este gesto,
e não pense em mim.
Te perdi,
mas ainda não estou lúcido.

Que este poema seja o último.

sábado, 2 de janeiro de 2016

Cartão de Visita

do melhor e pior tipo.
extremo a quem vê
sublime a quem sente
quente a quem pode

é a própria vida em stand by

a deixa para a próxima fala
a pausa mais exasperada
da alma a amar que sai


que passeia, que permeia
as cantigas, as caatingas
os sertões, faz chover
todas as desilusões.

é a certeza da dúvida
a borda do universo
o tolo converso
o bobo da corte
sentando no trono
a dor do falso
o mais forte abraço
a morte chorando

apresento-me, com desculpas.
ignorem as mentes cultas
(invejo-os o amor próprio)

aproveito o fim desse ópio
dos outros seres brilhantes
pra tentar me ser o bastante

sem evitar o evitável
sem bem saber por que vivo,
sentindo-me eternamente irresponsável
quanto àquilo que cativo.

Plano Novo

e diga-se de passagem:
há quem acredite
em sorte, ou quem diz
que é palpite dos deuses.
mas, bem, quantas vezes
a cor da sua roupa de baixo
ou um cacho de uva
caíram como uma luva
para lhe ajudar no ano?

é.
há quem tem fé
na sorte. outros
azar na fé. poucos
fé por fé e só

mas, se aceita uma dica:
não há recompensa maior
que conseguir sozinho.
quer dinheiro, paz, amor,
sorte, felicidade, o que for?
querer não vale nada.
ou desista de viver
ou procure seu próprio caminho

sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

Talvez Hoje, #AnoPoesia

Talvez que hoje seja o dia
Em que eu finalmente seja lido
Nas entrelinhas das estrelinhas
E me torne letras e mais letras
despido

Talvez que hoje seja aquele dia
Que não acaba nunca
E é por tantas vezes desejado
E repetido

Talvez que hoje seja um dia
Desses trezentos qualquer
Em que eu, licenciado poético,
Faça dele o que quiser
Inclusive poesia

Pra Começar o Ano

Dia primeiro.
Pra ti, és só mais um.
Soluças,
procuras abrigo onde não deveria.

Sentes o sol no rosto
e o cheiro de fumo no ar.
Para alguns, noites
como essa são comuns,

mas não pra ti.

Ainda sentes falta,
tu sabes disso.

Mas agora,
te senta e espera.
Solidão é fera indomável,
então nem tenta.
A cura é lenta,
porém eficaz.

Este poema é pouco
pra mostrar a falta
que aquele rapaz faz.